30 de jan. de 2011

Espiritualidade

Formação
            Cristo foi obediente até a morte de Cruz. (Cf. Fl 2,8)

Franc Card. Rodé, até então Prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica, lançou, na Solenidade de Pentecostes de 2008, uma Instrução denominada O Serviço da Autoridade e a Obediência, dirigida a todas as comunidades religiosas e para aqueles que mesmo não pertencendo a um Instituto de Vida Consagrada e nem a uma Sociedade de Vida Apostólica, são chamados à obediência a seus legítimos pastores. Aqui se encontram alguns pontos desta bela reflexão:

Aprender a obediência no cotidiano
10. Pode acontecer, portanto, que a pessoa consagrada tenha de “aprender a obediência” também a partir do sofrimento, ou pelo menos de certas situações particulares e difíceis: quando lhe é pedido, por exemplo, que deixe alguns projetos e idéias pessoais, que renuncie à pretensão de administrar sozinha a vida e a missão; ou todas as vezes em que o que é pedido (ou quem o pede) revela-se humanamente pouco convincente. Quem se encontra em tais situações não esqueça, então, que a mediação é, por sua mesma natureza, limitada e inferior àquela realidade à qual remete, e tanto mais o é em se tratando da mediação humana em relação à vontade divina; mas lembre-se igualmente, toda vez em que se defrontar com uma ordem legitimamente emanada, de que o Senhor pede que obedeça à autoridade que o representa naquele momento 17 e que Cristo também « aprendeu a obediência por aquilo que sofreu » (Hb 5,8).
A propósito, é oportuno recordar as palavras de Paulo VI: « Deveis, pois, experimentar nalguma medida o peso que atraía o Senhor para a cruz, esse “batismo em que devia ser batizado” e onde se acenderia aquele fogo que vos inflama a vós também (cf. Lc 12, 49-50); experimentar algo daquela “loucura” que São Paulo deseja a todos nós, porque só ela nos torna sapientes (cf. 1Cor 3,18-19). Que a cruz seja para vós, a prova do maior amor, como o foi para Cristo. Não existe, acaso, uma relação misteriosa entre a renúncia e a alegria, entre o sacrifício e a expansão do coração, entre a disciplina e a liberdade espiritual? ».18
Precisamente nestes casos sofridos é que a pessoa consagrada aprende a obedecer ao Senhor (cf. Sl 118,71), a escutá-lo e a aderir somente a Ele, na espera, paciente e cheia de esperança, da sua Palavra reveladora (cf. Sl 118,81), na disponibilidade plena e generosa de cumprir a sua vontade e não a própria (cf. Lc 22,42).
Na luz e na força do Espírito
11. Adere-se, pois, ao Senhor quando se descobre a Sua presença nas mediações humanas, especialmente na Regra, nos superiores, na comunidade,19 nos sinais dos tempos, na expectativa do povo, sobretudo dos pobres; quando se tem a coragem de lançar as redes na força « da sua palavra » (cf. Lc 5,5) e não de motivações humanas apenas; quando se escolhe obedecer não somente a Deus, mas inclusive aos homens, todavia, em qualquer caso, por Deus e não pelos homens. Escreve Santo Inácio de Loyola nas suas Constituições: « A verdadeira obediência não considera aquele a quem é prestada, mas sim aquele por quem se obedece; e se obedece só por nosso Criador e Senhor, é ao mesmo Senhor de todos que se obedece ».20
Se, nos momentos difíceis, quem foi chamado a obedecer pedirá com insistência ao Pai o dom do Espírito (cf. Lc 11,13), Ele o dará, e o Espírito dará luz e força para que seja obediente e fará com que conheça a verdade e a verdade o tornará livre (cf. Jo 8,32).
O próprio Jesus, em sua humanidade, foi conduzido pela ação do Espírito Santo: concebido no seio da Virgem Maria por obra do Espírito Santo, no início de sua missão, no batismo, recebe o Espírito que desce sobre Ele e o guia; ressuscitado, derrama o Espírito sobre seus discípulos a fim de que entrem em sua própria missão, anunciando a salvação e o perdão por Ele merecido. O Espírito que ungiu Jesus é o mesmo que pode fazer a nossa liberdade semelhante à de Jesus, perfeitamente conforme à vontade de Deus.21
É indispensável, portanto, que cada um se faça disponível ao Espírito, a começar pelos superiores, que precisamente do Espírito é que recebem a autoridade 22 e, « dóceis à vontade de Deus »,23 sob a sua guia a devem exercer.
Autoridade a serviço da obediência à vontade de Deus
12. Na vida consagrada, cada um tem que buscar com sinceridade a vontade do Pai pois, de outra forma, a própria razão de sua opção de vida se seria afetada; mas é igualmente importante levar adiante tal busca em companhia dos irmãos ou irmãs, já que é precisamente esta busca que une, que “constitui família unida a Cristo”.
A autoridade está a serviço desta busca, para que ela ocorra na sinceridade e na verdade. Na homilia de início do ministério petrino, Bento XVI afirmou significativamente: « O meu verdadeiro programa de governo é de não fazer a minha vontade, não perseguir as minhas idéias, mas pondo-me contudo à escuta, com a Igreja inteira, da palavra e da vontade do Senhor e deixar-me guiar por Ele, de forma que seja Ele mesmo quem guia a Igreja nesta hora da nossa história ».24 Reconheça-se, por outro lado, que a tarefa de ser guia de outros não é fácil, principalmente quando o sentido de autonomia pessoal é excessivo ou gerador de conflitos e competitivo em relação aos outros. É mister aguçar, da parte de todos, o olhar da fé diante desta tarefa, a qual deve ser inspirada na atitude de Jesus, servo que lava os pés de seus apóstolos para que estes tenham parte em sua vida e em seu amor (cf Jo 13,1-17).
Exige-se uma grande coerência da parte de quem guia os Institutos, as províncias (ou outras circunscrições do Instituto) e as comunidades. A pessoa chamada a exercer a autoridade deve saber que somente o poderá fazer se ela mesma, em primeiro lugar, empreender aquela peregrinação que leva a buscar, com intensidade e retidão, a vontade de Deus. Vale para ela o conselho que dava santo Inácio de Antioquia a um confrade seu no episcopado: « Nada se faça sem o teu consentimento, mas tu nada faças sem o consentimento de Deus ».25 A autoridade há de agir em modo tal que os irmãos ou as irmãs possam perceber que ela, quando ordena, o faz unicamente para obedecer a Deus.
A veneração pela vontade de Deus mantém a autoridade num estado de humilde busca, a fim de fazer com que o seu agir seja o mais conforme possível àquela santa vontade. Santo Agostinho recorda que quem obedece cumpre sempre a vontade de Deus, não porque a ordem da autoridade esteja necessariamente em conformidade com a vontade divina, mas porque é vontade de Deus que se obedeça a quem preside.26 A autoridade, porém, por sua vez, deve procurar assiduamente, com o auxílio da oração, da reflexão e do conselho de outros, aquilo que Deus verdadeiramente quer. Do contrário, o superior ou a superiora, em vez de representar a Deus, correm o risco de pôr-se temerariamente no seu lugar.
No intento de fazer a vontade de Deus, autoridade e obediência não são, portanto, duas realidades diferentes nem, muito menos, contrapostas, mas duas dimensões da mesma realidade evangélica, do mesmo mistério cristão, dois modos complementares de participar da mesma oblação de Cristo. Autoridade e obediência acham-se personificadas em Jesus: por isso, devem ser entendidas em relação direta com Ele e em configuração real com Ele. A vida consagrada tem como objetivo viver simplesmente a sua Autoridade e a sua Obediência.

Foto disponível em: http://www.google.com.br/imgres?imgurl=http://laravazz.files.wordpress.com/2010/01/diante_da_cruz.jpg&imgrefurl=http://laravazz.wordpress.com/2010/01
Texto completo disponível em:
http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/ccscrlife/documents/rc_con_ccscrlife_doc_20080511_autorita-obbedienza_po.html

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